A análise minuciosa para investigar o primeiro óbito atribuído ao Oropouche no Espírito Santo garantiu aos pesquisadores do Laboratório Central de Saúde Pública do Espírito Santo (Lacen/ES) e da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) um importante destaque no cenário internacional de saúde pública. O artigo científico referente a esse óbito, que foi confirmado oficialmente em dezembro de 2024 pela Secretaria da Saúde (Sesa), foi publicado na última segunda-feira (19), na renomada revista científica inglesa The Lancet.
Com o título “Unravelling the pathogenesis of Oropouche virus”, em português como “Desvendando a patogênese do vírus Oropouche”, a pesquisa apresenta a primeira investigação detalhada de um óbito provocado pelo Oropouche, utilizando diversas técnicas disponíveis no Lacen/ES e na Ufes, além da boa descrição do caso disponível no sistema de notificação e-SUS Vigilância em Saúde.
Desta forma, o estudo descreve os resultados obtidos nas diversas técnicas utilizadas durante a investigação, confirmando que de fato o vírus Oropouche foi o causador do óbito no paciente. Além disso, a investigação conseguiu analisar como o Oropouche agiu no corpo humano e quais consequências que levaram a esse óbito, integrando resultados multidisciplinares obtidos por meio de análises virológicas, histopatológicas, imunológicas, moleculares e até, via microscopia eletrônica.
O diretor do Lacen/ES e responsável pela coordenação da investigação, Rodrigo Ribeiro Rodrigues, conta que o vírus Oropouche é, desde a década de 1960, endêmico na região Amazônica, e que, a partir do ano de 2022, expandiu sua distribuição geográfica pelo Brasil, com surtos relatados em regiões não endêmicas, como Espírito Santo e Bahia. Motivo pelo qual, ele relata, que a investigação do óbito capixaba necessitava ser realizada de forma minuciosa.
“Para garantir que o óbito havia sido causado de fato pelo Oropouche, utilizamos diversas metodologias de análise diferentes para eliminar a presença e impacto de outros possíveis patógenos e confirmar o Oropouche como agente causador. Durante a investigação, testamos as amostras do paciente para 295 patógenos diferentes, sendo encontrado apenas o Oropouche”, explicou Rodrigues.
Além disso, por meio do estudo, os profissionais buscaram compreender alterações genéticas sofridas pelo vírus obtidos por meio de rearranjo genético e mutações, isto é, uma mudança na sequência genética que o vírus adquiriu, tornando o vírus Oropouche, que circula na região não endêmica, diferente e mais agressivo que o vírus original endêmico na região Amazônica.
“O caso nos chamou atenção pela rápida evolução do paciente, que foi a óbito em menos de 24 horas depois do início dos sintomas. Dados de nossa pesquisa sugerem que o vírus sofreu evolução através de mutações. O fato foi confirmado pelo sequenciamento genético e, com isso, pode ter aumentado sua virulência”, destacou o diretor do Lacen/ES e coordenador da investigação.
De acordo com a doutora em Biotecnologia Anna Clara Gregório Có, que atua no Núcleo de Biologia Médica do Lacen/ES, por meio do estudo, os profissionais puderam mostrar os insights da patologia que causou o óbito, auxiliando outros profissionais a identificarem casos parecidos, seguindo as mesmas técnicas utilizadas.
“A gente investigou um caso de óbito com vários detalhes que não são encontrados em outros artigos, porque, às vezes, os estudos utilizam apenas uma técnica e, no nosso, foram utilizadas diversas técnicas de várias disciplinas. Com isso, conseguimos ter uma compreensão melhor do que aconteceu com paciente e provocou seu óbito”, contou Anna Clara Gregório Có.
Além do material descritivo, a pesquisadora ressaltou que o estudo traz como possibilidade também o alerta às vigilâncias no monitoramento de futuros casos e na identificação de casos semelhantes. A profissional destacou ainda a importância do trabalho ter integrado um grupo de pesquisa de diferentes setores, por meio de uma equipe multidisciplinar. “Envolveu um grupo de pesquisa de vários setores, com colaboração de pesquisadores da Ufes, uma equipe multidisciplinar que permitiu um olhar mais amplo e aprofundado”, disse.
A “Unravelling the pathogenesis of Oropouche virus” foi produzida por profissionais que atuam no Lacen/ES; na Subsecretaria de Vigilância em Saúde, da Sesa; e na Universidade Federal do Espírito Santo.
Fazem parte da equipe responsável os pesquisadores: Anna Clara Gregório Có, Gabriela Colombo de Mendonça, Felipe Donateli Gatti, Thiago de Jesus Sousa, Eric Arrivabene Tavares, Joana Zorzal Nodari, Renan Garcia de Moura, Paola de Oliveira Lopes, Julia Del Piero Pereira, Lyvia Neves Rebello Alves, Tadeu Ériton Caliman Zanardo, Flávio Cunha Monteiro, Claudia N Duarte dos Santos, Isabela Ribeiro Rodrigues, Jaqueline Pegoretti Goulart, Carlos Henrique Fantecelle, Luciana Polaco Covre, Daniel Claudio Oliveria Gomes, Marco Cesar Cunegundes Guimarães, Andressa Alves Martins Cadete Salles, Dijoce Prates Bezerra, Wanderson de Souza Lugão, Felipe Gomes Naveca, Suwellen Sardinha Dias de Azevedo, Edson Delatorre, Fausto Edmundo Lima Pereira e Rodrigo Ribeiro-Rodrigues.
por Syria Luppi / Luciana Almeida / Danielly Campos / Thaísa Côrtes / Ana Cláudia dos Santos